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Gourmet ou especial?

 
Seria o café especial um gourmet?
Ensei Neto
O início dos anos 2.000 foi marcado por uma série de mudanças de grande impacto no mercado de café no Brasil. Nesse tempo, as primeiras redes de cafeteria ganharam as ruas, o café expresso começou ter espaço nesses novos locais de consumo e os primeiros campeonatos de barista aconteceram em São Paulo. Contribuindo com esse pequeno turbilhão, alguns produtores audaciosamente lançaram seus próprios cafés, num movimento que vem se multiplicando até hoje.
Com o objetivo de garantir participação mais intensiva dos cafeicultores no principal evento mundial do setor, capitaneado pela antiga Associação Americana de Cafés Especiais, e, dessa forma, promover os cafés produzidos em nosso país, surgiu o projeto Cafés do Brasil, que começou com o mote “Um país, muitos sabores” e hoje trabalha com “Brasil, a nação do café”.

Era um momento em que também se fazia necessário criar uma nova nomenclatura para os cafés que eram comercializados no mercado brasileiro, até então restritos às marcas ou, quando muito, a um processo industrial, que poderia ser, por exemplo, o café em pó embalado a vácuo.

Aproveitando o burburinho, a ABIC – Associação Brasileira da Indústria do Café lançou um projeto que até hoje, apesar da necessidade de ajustes, se mantém único no mundo: a classificação dos cafés torrados ou industrializados. Esse projeto dividiu os cafés industrializados das empresas associadas em três categorias: Tradicional, Superior e Gourmet, numa escala de zero a dez pontos.

A categoria Tradicional, onde se encontra a esmagadora maioria dos cafés industrializados do Brasil, inclusive os líderes de vendas, tem a bebida com toque medicinal típico do riado e que causa estragos no estômago. Logo acima vem a categoria Superior, que tem bebida sem os defeitos capitais, o trio PVA (Preto ou Podre, Verde e Avinagrado). Pode apresentar adstringência, porém algo bem menos intenso que presente no Tradicional. Finalmente, a categoria Gourmet tem pontuação que começa em 7,3, denotando que está acima da média.

Já de saída algumas empresas se apoderaram do nome Gourmet, aplicando-o em seus produtos mesmo que não tivessem passado pelo crivo dos avaliadores da ABIC, gerando razoável confusão no mercado. Diria que esse foi o primeiro movimento de gourmetização, quando um produto é ultravalorizado por pretender entregar uma experiência que nem sempre se concretiza.

Torrefações menores, para se diferenciarem, passaram a utilizar o nome Especial, principalmente quando a matéria prima (o café cru) era avaliado por critérios da BSCA – Associação Brasileira de Cafés Especiais ou da então SCAA – Associação Americana de Cafés Especiais. Para ambas, apesar de empregarem metodologias diferentes, “especial” é o café cuja bebida supera 80 pontos em uma escala que vai até 100.

Confusão armada, qual é a melhor forma de saber se um café é realmente tudo o que se dispõe a entregar?

Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal

Regra fundamental, que vale como mantra: confie nos seus sentidos. Sempre!

Daí vem a segunda regra: café bacana não pode ser amargo. O gosto amargo é sinal de problemas, a exceção do gosto da cafeína, que lembra algo como o jiló. Outros, principalmente o desagradável medicinal, que lembra no mínimo a dipirona, deve ser evitado assim como o vampiro foge do colar de alho… Uma excelente bebida de café é um interessante jogo entre os sabores doce e ácido, principalmente aquele que lembra o limão, que pode se tornar ainda melhor com a presença de sabores florais ou frutados.

A sua escolha independe de pontuação ou de nomes de tipos ou padrão, mas tão somente do que lhe agrada. É isso que torna um café especial!

 

FONTE: O Estado de S. Paulo – Paladar – 25 janeiro 2018

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